Um gesto de amor entre animais: esta cachorra visita o túmulo do amigo e fica ali horas seguidas.
Kaya e Gaspar passaram a vida inteira praticamente juntos e, mesmo depois da morte do amigo, a cachorra não quis se separar dele. Ela visita o local em que o cachorro foi enterrado e fica no túmulo durante horas, como se pudesse se consolar da ausência.
Os dois cachorros viviam em casas diferentes. Gaspar morava com Marcelo Rodriguez, compositor e produtor musical paraguaio, enquanto Kaya é a fiel companheira da mãe do músico.
Mas as casas de ambos são vizinhas.
Os dois cachorros são dogues alemães: Gaspar tinha a pelagem preta, enquanto Kaya é um dogue alemão arlequim, com o fundo da pelagem branca, salpicada de manchas pretas. Como todos os cães da raça, estes são dois gigantes cheios de simpatia e doçura.
Os cachorros foram adotados na mesma época e sempre conviveram.
Todos os dias, eles brincavam juntos e, quando Marcelo tinha de viajar a serviço, Gaspar era recebido como um hóspede muito especial.
A amizade entre os dois peludos era tão forte que continuou mesmo depois que Gaspar começou a mostrar os primeiros sinais de insuficiência renal, doença mais comum entre as raças de pequeno porte, mas que pode acometer qualquer cachorro.
Os sinais são muito difíceis de serem percebidos. A doença começa a se manifestar com falta de apetite, perda de peso e letargia.
Apenas em estágios mais avançados, surgem os vômitos, desidratação e dificuldade crescente para urinar.
Aos poucos, Gaspar foi perdendo a imensa quantidade de energia que caracteriza os cachorros. Kaya, apesar de manter a saúde em dia, continuou a acompanhar o amigo em atividades mais leves e delicadas, que exigiam menor esforço físico.
Por fim, em janeiro de 2022, Gaspar sucumbiu à doença. No Instagram, Marcelo despediu-se do amigo com fotos e uma mensagem comovente:
"Numa quarta-feira, no começo da tarde, você dormiu em um quarto no quinto andar do hospital, escutando música com muito estilo, como sempre gostou.
Você me ensinou coisas incontáveis, sem dizer uma só palavra.
Obrigado por todo este tempo em que você foi meu companheiro. Você teve uma vida especial neste mundo e sempre estará entre nós. Conhecendo você, voluntarioso e teimoso, sei que você não vai estar muito longe. Obrigado, Gaspar, por tudo que você viveu."
O tutor de Gaspar prestou uma bela homenagem ao companheiro de tantos anos.
A memória emotiva que irá permanecer, contudo, é outra: a atitude de Kaya, frente ao desaparecimento do amigo, com quem tanto aprendeu e se divertiu.
O corpo do cachorro foi enterrado no quintal da mãe de Marcelo, tutora de Gaspar. Kaya não acompanhou a operação, porque tanto Marcelo quanto a mãe imaginaram que ela não conseguiria entender nada do que estava acontecendo.
Mas, de alguma forma, Kaya parece saber que alguma coisa do amigo está ali, naquele cantinho do terreno. Todos os dias, quando o espaço é liberado para a cachorra, ela se dirige ao túmulo de Gaspar e fica ali durante horas, talvez tentando identificar a presença do companheiro de muitos anos.
Kaya está dando, há vários dias, uma verdadeira lição de solidariedade e amizade. Ela simplesmente se deita na terra úmida, ainda com sinais de ter sido revolvida, e fica ali, triste, quem sabe prestando o último tributo ao amigo, que certamente já está descansando no céu dos cachorros.
Marcelo também postou imagens da cachorra deitada no túmulo do velho amigo. Ele escreveu: "Esta é Kaya, a amiga, que não está conseguindo se afastar da sepultura. Os animais são seres superiores que nós nunca compreendemos e, muitas vezes, nem sequer merecemos a companhia".
Quem já conviveu com um cachorro sabe que eles sentem falta dos amigos – humanos, caninos e até felinos – quando eles desaparecem subitamente, por qualquer motivo. Eles se mostram entristecidos e buscam o parceiro ausente.
Alguns cães choram, apresentam falta de apetite e desinteresse pelas brincadeiras prediletas e podem até adoecer. Mas será que eles entendem a morte, a extinção da vida? Para a pesquisadora Barbara J. King, a resposta é positiva.
King é professora emérita do College of William and Mary, na Virgínia, uma das instituições universitárias mais antigas dos EUA. De acordo com a pesquisadora, um cachorro entende quando outro morre e as evidências disso estão nas alterações comportamentais que podem ser observadas.
A falta de contato e interação altera substancialmente o comportamento do cachorro, que, pode, por exemplo, deixar de executar uma tarefa ou brincadeira que realizava prazerosamente na companhia do amigo morto.
Os cachorros dão sinais evidentes de luto, que são muito parecidos com os sinais humanos: choro, tristeza, isolamento, falta de apetite, desinteresse pelas atividades cotidianas, aumento das horas de sono, estresse e ansiedade.
Tudo isso mostra a saudade e indica que o cachorro está tentando processar a perda, mesmo que não compreenda literalmente a morte como um processo natural e definitivo.
É possível também que o cachorro passe por períodos de busca, em que procura exaustivamente o amigo perdido. Os tutores precisam ajudar os peludos a superar esta etapa, que, boa ou má, faz parte da vida.